Fr. Martin Thornton (1915-1986)

UMA INTRODUÇÃO À TEOLOGIA DO REMANESCENTE

Introdução

Em seu livro Teologia Pastoral, o teólogo anglicano Martin Thornton (1915-1986) articula e defende uma “Teologia Remanescente”. Padre Thornton foi um dos maiores especialistas em espiritualidade e teologia mística do século passado. Ele estava preocupado com os aspectos pastorais da Igreja em especial a missão e o discipulado. Seu objetivo nesse livro é apresentar ao pároco uma alternativa para julgar a saúde de sua igreja por seu tamanho ou sua homogeneidade. Thornton recomenda uma alternativa que ele chama de teoria do Remanescente, que ele baseia na tradição hebraica do Antigo Testamento e na própria vida e obra de Jesus Cristo. Martin Thornton foi sacerdote do Oratório do Bom Pastor servindo na Diocese de Truro, Inglaterra.  Thornton escreveu extensivamente sobre a vida espiritual. Sua teologia é herdeira do Movimento de Oxford e por isso teve pouca aceitação entre os liberais da Comunhão Anglicana ou os evangélicos do GAFCON.

A base do seu livro é a “hipótese remanescente”. A bíblia cristã menciona em diversos momentos a ideia do “fiel remanescente”. Neste caso, os remanescentes são as pessoas que resistiram as tentações do mundo pecaminoso, não se desvirtuaram ou se paganizaram. Os remanescentes na bíblia são as pessoas que permanecem na fé em Deus. No cerne do ensinamento cristão, e particularmente destacada na teoria do Remanescente de Thornton, está a ideia de que a obra local e corporificada de Deus tem efeitos em todo o mundo. Esta é a sua solução para o problema da teologia pastoral que ele vê na Igreja da Inglaterra. Embora tenha sido publicado pela primeira vez em 1956, quando a frequência à igreja era muito maior que a atual e a Igreja tinha uma influência na sociedade inglesa muito maior do que é hoje, Thornton lutou com a forma como o pároco deveria responder ao desengajamento geral da vida paroquial.

2. A centralidade da paróquia

Antes de mais nada precisamos entender o conceito de paróquia. Etimologicamente paróquia vem do grego (paroikia) e significa “a morada do padre”. O oitavo arcebispo de Canterbury, Teodoro de Tarso (c. 602–690) aplicou o termo eclesiástico paróquia ao municio anglo-saxão formato que já existiam. Desde então a paróquia com sua (s) igreja (s) paroquial (is) é a unidade territorial básica da Igreja da Inglaterra. Nem mesmo a reforma mudou isso. Aliás, como Thornton, percebe essa é uma das características do anglicanismo. Cada uma dessas paroquias está dentro de uma das 42 dioceses dividido entre os trinta de Cantuária e os doze de York. Existem cerca de 12.500 paróquias da Igreja da Inglaterra atualmente.

Cada uma dessas paróquias eclesiásticas é administrada por um pároco, especificamente reitor, vigário ou pároco perpétuo, dependendo do caso. Esta pessoa pode ser assistida pelo (s) pároco (s) e/ou diácono (s), também ele ordenado(s) e por clérigos leigos como os leitores. Existe uma grande variação no tamanho das paróquias, participantes e número de batizados, casamentos, funerais e doações.

3. O mundo é a paróquia 

Historicamente o clero anglicano era responsável por todas as pessoas que viviam dentro de sua paróquia. Mas o que o padre faz com todas as pessoas que só aparecem na igreja esporadicamente? Ele cuida daqueles dentro dos limites da paróquia que são apenas nominalmente cristãos? Thornton colocou desta forma: “Quando um padre é instituído em uma paróquia, diz-se que ele adquire uma ‘cura de’ ou ‘cuidado de’ almas, ele aceita uma mordomia e assume uma responsabilidade. A primeira dificuldade surge quando, assumindo uma responsabilidade perante Deus, perguntamos precisamente de quem é a responsabilidade do sacerdote”.

As duas respostas normativas a esta questão, de acordo com Thornton, são que o padre é responsável por todos na paróquia, ou é responsável apenas pelos membros ativos da igreja paroquial em um determinado momento. Essa primeira possibilidade, que Thornton chama de “multitudinismo”, é insatisfatória porque nem todos os que vivem dentro dos limites paroquiais podem querer atendimento espiritual. A realidade é que muitas pessoas em uma paróquia podem não ser cristãs. E aqueles que são nominalmente cristãos, se forem tratados como se fossem discípulos comprometidos, apenas contribuirão para a impressão de que o padrão para a vida cristã é imensuravelmente baixo. Isto para não falar da impossibilidade logística de o padre atender a tantas pessoas.

A segunda possibilidade, de que o padre deva cuidar apenas dos membros ativos da igreja, embora leve a sério o fato de que um padre é limitado e apenas uma minoria de pessoas está envolvida na vida paroquial, cria um tipo de elitismo em que o cuidado pastoral é reservado apenas para aqueles que arregaçaram as mangas no trabalho da paróquia. Então Thornton sugere uma terceira possibilidade. Ele escreve: “A única esperança de resolver nosso problema parece residir na eliminação total do pensamento numérico e em ver a paróquia mais a cura das almas como um todo sacramental – isto é, como um organismo integrado”. Ele continua dizendo que: “à Igreja Católica é o corpo, não a soma, de todos os fiéis; um todo orgânico compreendendo as paróquias como todos orgânicos compreendendo as almas como todos orgânicos: o que quer dizer apenas que a videira consiste em ramos que consistem em células. E a relação entre o organismo católico e o paroquial é vista como uma recapitulação ou microcosmo: ideias constantemente recorrentes na teologia cristã”.

A ideia aqui é que não é a multidão nem o grupo de elite dos paroquianos que são mais importantes. Em vez disso - se a paróquia é um microcosmo da Igreja Católica - um pequeno grupo de paroquianos adorando, na verdade, instancia o corpo de Cristo em um determinado tempo e lugar, de modo que a adoração é oferecida vicariamente em nome de toda a Igreja. Na prática isso significa que os números não importam. O que importa é qualidade. Isso não significa se acomodar com poucas pessoas. A Igreja ou é “missionária” ou não é Igreja. De fato, desde a criação ou antes da fundação do mundo, como diz São Paulo, na Carta aos Efésios, Deus nos escolheu em Cristo. Essa escolha ou predestinação nos coloca diante de um desejo ou projeto ou desígnio de Deus: o de reunir todos os homens e todas as mulheres, suas criaturas, no seu coração amoroso de Pai. Para essa reunião Ele envia Jesus Cristo, seu único Filho: “quando chegou a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher…” (Gl 4,4).

O envio de Jesus Cristo, que a teologia chama de “missão do Filho”, foi precedido da ação de Deus junto ao povo de Israel. O povo de Israel foi prefiguração da Igreja. A história do povo de Israel, testificada no Antigo Testamento, é toda ela envolvida em uma missão: os patriarcas, os juízes, os reis, os profetas, os sábios, todos eles tinham uma missão dada pelo Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó. Até João Batista a missão era de preparar os caminhos do Senhor, preparação que celebramos de modo especial no “advento”. Missão significa algo permanente. Deus chama para uma vida com Ele. Essa é a missão. Discipulado e missão estão juntas.

4. A missão é fazer discípulos

Thornton enraíza a hipótese do Remanescente no próprio ministério de Jesus, que era muito paroquial e focado principalmente no cuidado pastoral de seus discípulos mais próximos. Jesus não começou a Igreja pensando em número ou em oferecer um produto “moderno e adequado” ao gosto das massas de sua época. Na verdade ele fez bem diferente. Em primeiro lugar a atenção de Jesus foi dada quase exclusivamente a Israel. Além disso ele escolheu um grupo de doze discípulos que foi sendo ampliado lentamente em círculos concêntricos. Mas o escopo do ministério terreno de Jesus, embora permanecesse extremamente estreito numérica e geograficamente, não tinha o propósito de excluir todos os outros do reino de Deus, mas o próprio meio pelo qual ele trouxe o reino a toda a humanidade.

A teologia de Thornton é fiel a essa evidencia bíblica e a sua experiência no ministério pastoral. Leva a sério a finitude humana, mas também busca articular uma visão teológica do que é possível, mesmo diante desses limites. Não posso visitar todos na minha paróquia. Mas visitar e orar com alguém tem repercussão no todo. Nem todos estão reunidos no santuário no domingo e perdem algum benefício disso, mas ainda assim os dons de Deus têm um meio de abençoar todo o povo de Deus por meio do sacrifício de louvor e ação de graças que nós 70 ou 80 pessoas oferecemos. A vida e o sacrifício de Cristo em um só lugar e uma vez é o meio de salvação para o mundo inteiro ao longo do tempo: “Cristo é o Salvador do mundo inteiro, e é importante perceber que, além de alguns quilômetros quadrados no Oriente Médio, ele não se preocupou em olhar para isso. Aqui está a resposta final ao paroquialismo “estreito”: na oração e na adoração de Jesus, os arredores de Belém são o mundo, seu pequeno grupo social é tanto sua cura de almas quanto o microcosmo da humanidade de todas as idades, credos e classes. Em seus primeiros trinta anos de perfeita obediência, oração e adoração, toda a infância, toda a infância, toda a humanidade e toda a criação são recapituladas. Belém é o epítome de cada paróquia e de cada lar; tudo é sacrificado naquele cuja própria santificação é “por causa deles”. (João 17:19)” O grupo de cristãos fieis que se reúne para receber a comunhão representa toda a igreja e se torna o meio pelo qual toda a igreja é alimentada. O “Remanescente” é o coração pelo qual o sangue é bombeado para todo o corpo – “como o fermento leveda a massa ou o sal dá sabor ao todo”. A “chave do sucesso” para Thornton está no discipulado desse pequeno grupo: “Uma paróquia de dez mil almas está verdadeiramente diante de Deus, tanto organicamente quanto individualmente, se o Remanescente de três recitar o Ofício da Igreja. É interessante que, enquanto os serviços dominicais são pensados em termos de números, um elemento do vicário é frequentemente imputado ao ofício do padre durante a semana. No entanto, a teologia anglicana insiste que o canal criativo da Graça no mundo não é o sacerdócio, mas a Igreja; assim, há uma distinção vital entre o sacerdote sozinho e o sacerdote mais o Remanescente de um. Não existe tal distinção particular entre padre mais um e padre mais dois, sessenta ou seis mil”. A teologia de Thornton oferece uma alternativa ao vanguardismo liberal e ao populismo neopentecostal. No primeiro caso trata-se de resistir à tentação de reduzir os sacerdotes a meros “assistentes sociais” ou “militantes” e a própria missão a uma mera presença política no mundo. No segundo caso de transformar o evangelho em mais um produto comercial. A Igreja Anglicana terá que recomeçará com pequenos grupos, com movimentos, e isto graças a uma minoria que terá a fé como centro da experiência. Para nós, seguramente, tudo começou em Cristo, que reuniu um pequeno grupo para formá-lo na adesão à proposta de salvação. A Igreja primitiva só podia aderir às pequenas comunidades, que se reuniam nas casas. “Estavam todos reunidos num mesmo lugar” (At 2,1).  Por isso o caminho são os pequenos grupos começando pela família (igreja doméstica) e seus membros para assumirem um compromisso continuo na fé. Thornton resumia isso em três passos: a Santa Missa, o Ofício Diário e a Oração Privada. Além disso ele defendia que os “remanescestes fieis” elaborassem uma Regra de Vida, adaptada para suas vidas como leigos no mundo. Finalmente, Thornton, afirmava que isso só funcionaria se essas pessoas recebem direção espiritual em suas comunidades locais.

O REMANESCENTE FIEL: MÍSTICA E MISSÃO MARTIN THORNTON

Pouco mais de um século depois que o Movimento de Oxford (1833-1845) desafiou as eclesiologias convencionais na Igreja da Inglaterra do século XIX, o teólogo menor Martin Thornton propôs em uma série de trabalhos de 1956 a 1963 que os princípios eclesiológicos do movimento seja colocado em prática pastoral, reconhecendo “o Fiel Remanescente” e concentrando o cuidado pastoral em seu ministério vicário de adoração e oração. Thornton afirmou não ter desenvolvido um princípio eclesiológico inovador, mas ter descoberto uma dinâmica com raízes na teologia e história bíblica judaica e cristã; na verdade, ele argumentaria que o Remanescente Fiel é essencial para o “Corpo de Cristo”.  Thornton foi um teórico pastoral de meados do século 20, não um teólogo sistemático. Seu principal interesse era a teologia ascética, especialmente o papel da adoração e da oração na comunidade cristã. O objetivo de seu trabalho publicado era educar o clero e os leigos anglicanos e defender a reforma da vida paroquial anglicana. Ele afirma ter inventado o termo “teologia aplicada”, que ele via como um corpo de conhecimento e prática que leva a igreja e os cristãos individuais à “Visão de Deus”. Ele preferia pensar na teologia ascética não como um assunto dentro da teologia cristã, mas como prática espiritual, a saber, teologia aplicada. O clero, ele acreditava, deveria ser treinado com conhecimento para aplicar o “asceta cristão” da mesma forma que os médicos são treinados para aplicar os princípios da medicina. Ele criticava a igreja por sua má formação do clero. As faculdades e seminários estariam formando “assistentes sociais”, “pesquisadores” ou “vendedores”. Ele acreditava que o clero deveria ser treinado como diretores espirituais, praticantes dentro de uma tradição de conhecimento e técnica, embora não necessariamente dotados espiritualmente; de fato, Thornton desconfiava daqueles que poderiam ser chamados hoje em dia de “estrelas espirituais” como ineficazes para a igreja como um todo. Dadas suas predisposições acadêmicas e pastorais, era inevitável que Thornton enunciasse uma doutrina da igreja. Ele afirma ter encontrado o Fiel Remanescente em seu exame das escrituras judaicas e cristãs, da tradição ascética cristã e da filosofia moderna. As raízes teológicas de Thornton estão no Movimento de Oxford, que ele consistentemente chama de “Reforma de Oxford”. Os “tractários” convocaram uma igreja latitudinária (liberal) a retornar às suas raízes católicas, recuperando os primeiros teólogos da “igreja indivisa” e reafirmando a igreja como uma instituição divina não sujeita ao estado. Thornton também herdou o desenvolvimento da teologia da alta igreja conhecida como a escola Lux Mundi, cuja luz guia era o Bispo e teólogo de Oxford, Charles Gore, embora ele pareça ter desconsiderado a consideração séria deste último movimento pelo estudo crítico histórico da Bíblia. Ele não era um liberal ou evangélico. Thornton, então, era um “alto clérigo” do século 20, que abraçou as convicções teológicas e os valores espirituais de teólogos anglicanos como John Keble e EB Pusey. Suas mais profundas simpatias, no entanto, estavam com a teologia carolina e a tradição espiritual católica medieval que a precedeu. Ele escreveu: …concedendo uma verdadeira grandeza aos líderes do Reavivamento Evangélico e do Movimento de Oxford, eles nos ensinam pouco que já não tenhamos aprendido nos períodos medieval e carolino. O melhor em William Law é Caroline; os evangélicos nos devolvem, em ethos ascético, a São Francisco e a São Bernardo; e o melhor do tractarianismo pastoral remonta ao catolicismo inglês medieval. O exemplo e os escritos de John e Charles Wesley, de Froude, Pusey e Keble podem nos inspirar, mas se buscarmos uma base sólida de teologia ascética sobre a qual uma espiritualidade do século XX possa ser construída, então acho que devemos considerar o sistemas dos séculos XIV e XVII como nossas fontes mais recentes”. Thornton não era ritualista, e ele não estava sozinho em lamentar que a prática litúrgica católica romana do final do século 19 se tornasse o sinal externo e visível da alta igreja anglicana. Não que Thornton se opusesse ao ritual - ele não era puritano -, mas acreditava que a teologia da alta igreja anglicana deveria ter produzido algo de significado mais profundo do que a controvérsia sobre o uso ou não de casulas. Ele lamentou acima de tudo que o Movimento de Oxford não tivesse fornecido à igreja ordens de marcha específicas, por assim dizer, para trazer a alta teologia da igreja para os coros e bancos das igrejas inglesas. “O Remanescente Fiel”, afirma Thornton, é o “meio-termo” que falta entre descrever a igreja em termos teológicos e seu impacto prático sobre cristãos individuais que praticam sua fé. É bem sabido que, em face do erastianismo, da convenção e do moralismo, a Reforma de Oxford foi centrada na doutrina da Igreja; não no sentido do que a Igreja ensina, mas do que ela é. Procurou um retorno à ideia tradicional da Igreja como um organismo sobrenatural: a Videira, a Noiva, o Corpo de Cristo. À distância de mais de um século, parece bastante óbvio que tal doutrina, surgida naquela época em particular, teria importantes consequências sociais e políticas. Se a convulsão que causou foi prevista em Oxford, é difícil dizer, nem é justo acusar as grandes figuras de Oxford de falta de senso pastoral; no entanto, o Movimento foi, e permaneceu, essencialmente intelectual. Foi no melhor e próprio sentido do termo “acadêmico” e, se as circunstâncias o tornassem um assunto de importância nacional, nunca se preocupou seriamente com a missão – ou mesmo com a teologia pastoral. Mas se os reformadores não estavam muito preocupados com as paróquias, o clero paroquial se interessou intensamente pelo Movimento. Duas etapas absolutamente fundamentais para qualquer progresso ascético saudável foram omitidas e, novamente sendo sábias apenas após o evento, isso deve significar o caos pastoral. A primeira é a omissão do “meio-termo” essencial entre o cristão individual e o Corpo Místico total – a sociedade paroquial local. Em segundo lugar, há o exemplo mais flagrante do abismo acadêmico pastoral. Duas etapas absolutamente fundamentais para qualquer progresso ascético saudável foram omitidas e, novamente sendo sábias apenas após o evento, isso deve significar o caos pastoral.  É curioso… que enquanto a Reforma de Oxford estava quase exclusivamente preocupada com a doutrina da Igreja – com o que a Igreja é – sua manifestação local, esse “meio termo” de progressão, é continuamente deixado de lado no pensamento pastoral moderno. Em todas as nossas variadas discussões sobre batismo “indiscriminado”, ou casamento, sobre divórcio, liturgia, evangelismo e disciplina, a saúde, a força e as necessidades da igreja local são invariavelmente omitidas. Ou discutimos os primeiros princípios, que é um passo sábio, mas que permanece “acadêmico”, ou cada “caso” é tratado no vácuo ¼ As decisões individuais só podem ser tomadas corretamente quando as necessidades da Igreja local foram consideradas tal “Igreja local” deve primeiro existir de forma prática e tangível: novamente, o Remanescente parece ser a única possibilidade. O impulso teológico de Thornton para trazer a eclesiologia ao nível da prática está implícito em todas as discussões sobre a natureza da igreja. As reflexões eclesiológicas contemporâneas são pesadas em grande parte não apenas por força de sua visão teológica, mas também quanto à sua praticidade para o ministério paroquial. Na medida em que esta ou aquela indagação sistemática sobre a natureza da igreja fica aquém da aplicação prática, é improvável que os pastores as levem a sério. Miroslav Volf, por exemplo, sustenta: A salvação e a igreja não podem ser separadas. A antiga fórmula era extra ecclesiam nulla salus. Libertada de seu elemento de exclusividade, que justamente manchava sua reputação, a fórmula expressa com precisão o caráter essencialmente comunitário da salvação ¼ Experimentar a fé significa tornar-se um ser eclesial. Nem pode ser de outra forma se a igreja deve ser a experiência proléptica na história da integração escatológica de todo o povo de Deus na comunhão do Deus trino”. O Remanescente Fiel de Thornton ocupa o mais interior dos três anéis paroquiais. Seus membros compreendem o núcleo orante da paróquia, mas também da “Igreja Militante” universal. Ele adere ao que Thornton chama de “a Regra da Igreja”, ou seja, o Ofício Diário, a Eucaristia e a oração privada sob direção espiritual. Thornton sustenta que tais paroquianos e o que pode ser chamado de Remanescente universal através da história cristã são pessoas comuns de devoção extraordinária, mas mais proficientes do que espiritualmente dotados. Não seria incomum encontrar entre os Remanescentes oblatos e associados de ordens religiosas; na verdade, Thornton viu o renascimento das ordens religiosas inglesas após o Movimento de Oxford como evidência de que o Remanescente paroquial também havia retomado seu lugar na espiritualidade inglesa. O Remanescente, longe de ser um segmento amputado – a panelinha destacada do todo – está no centro do organismo paroquial e do poder que se estende além dele. É o próprio coração que recapitula e serve ao todo; o coração do Corpo de Cristo no microcosmo, e sua relação com seu ambiente é a relação entre Cristo e os doze, com o mundo deles. Este coração palpitante bombeia o sangue da vida para todo o corpo como o fermento leveda a massa ou o sal saboreia o todo. ¼ Não há nada tão contagioso quanto a santidade, nada mais penetrante que a Oração. Isso é precisamente o que a Igreja tradicional entende por evangelismo e o que o distingue do recrutamento. O conceito Remanescente é mais do que o “pequeno núcleo agradável” apoiado por uma teoria confortável. Representação verdadeira, vicariedade real”. Thornton fundamenta a vicariação do Remanescente na teologia sistemática de EL Mascall (1905-1993) contemporâneo de Thornton e colega sacerdote do Oratório do Bom Pastor, provavelmente o maior teólogo anglo-católico do século XX. Não é, porém, apenas a parte humana da ordem criada que recebe a redenção e faz a sua verdadeira auto-oferta a Deus unindo-se “com anjos e arcanjos” no culto celestial. Todo o reino material está envolvido, pois o homem é o “sacerdote da natureza”. Thornton não tem terminologia específica para o próximo anel paroquial, embora elabore sua existência e propósito teológica e historicamente. Resumidamente, compreende “apoiadores entusiásticos, aprendizes, ou geralmente 'ascendentes'”. Este círculo da igreja está mais interessado em programas do que em oração e é provavelmente mais numeroso do que o Remanescente. Sua fé pode ser robusta ou não, mas eles tendem a não ter tempo nem inclinação para se engajar na Regra da Igreja. Eles são fiéis adoradores de domingo, apoiadores financeiros e não teriam escrúpulos em considerar sua participação na igreja igual à sua participação em outras organizações dedicadas a boas obras. Alguns podem aspirar a se tornar um com o Remanescente. Thornton, um ávido jogador de críquete, não é avesso a considerar este círculo paroquial secundário no sentido atlético. O círculo paroquial externo seria “os demais, espectadores, apáticos ou antagônicos”, cristãos e não cristãos, todos relacionados com a paróquia e a Igreja universal de maneira negativa e positiva. Thornton não faz distinção teológica entre a igreja local – a paróquia – e a Igreja universal no mundo. O maior é recapitulado no menor e o menor é necessariamente parte do todo. Na prática, não é incomum que esse terceiro círculo de paroquianos faça exigências estridentes, embora raras, à igreja, especialmente no que diz respeito a “ritos de passagem” como batismo e casamento; nesse caso, afirma Thornton, a acomodação cheira a “multitudinismo”, que ele considera uma prática pastoral ineficaz sem base na teologia cristã. Claramente, nossas paróquias contêm os poucos realmente fiéis, o ocasional “frequentador” e todos os outros; a teologia paroquial busca um padrão abrangente de relações entre [sic] esses três estratos. O que chamei de multitudinismo falha em enfrentar os fatos, fingindo que sua paróquia é uma massa uniforme… A paróquia vista como organismo, elaborada no que proponho descrever como o Conceito Remanescente, dispõe seus três estratos como círculos concêntricos nos quais o poder do centro permeia o todo. “Permanece o fato de que a raça humana não é a Igreja Cristã, embora a Igreja seja destinada a todos os homens e os reivindique a todos, e embora não haja nenhum homem que esteja totalmente excluído da vida redentora da Igreja, que, como um rio em inundação, transborda seus limites formais e irriga a terra circundante”. [FN: Mascall, EL Corpus Christi 12.] A teologia paroquial deve dar expressão prática a este fato teológico. A afirmação de Thornton de que o Remanescente é a essência da igreja está enraizada nas escrituras judaicas e cristãs. O termo “remanescente” vem da literatura profética judaica. Thornton se esforça para mostrar que o termo não precisa conotar exclusividade. Deve-se insistir que o “Remanescente” é um termo altamente técnico com raízes embutidas na profecia hebraica e … ramos que se espalham pela tradição cristã. O princípio é mantido e o termo usado sucessivamente por Eliseu, Amós, Miquéias, Primeiro Isaías, Sofonias, Jeremias, Ezequiel, Zacarias, Joel e Esdras; alcançando sua consumação mais completa e exposição mais clara no Deutero-Isaías. Essa insistência é necessária porque, em inglês claro, a palavra tem um som “exclusivo” e uma importância numérica, ambas as quais rejeitamos. Thornton interpreta Israel, o povo escolhido, como o Remanescente da humanidade, “os eleitos, a casta sacerdotal”. A tradição profética de Israel consistentemente apela ao Remanescente dentro de Israel para manter sua pureza de adoração e fé; de fato, “a salvação do mundo depende da fé de Israel, o instrumento escolhido, que por sua vez gira em torno do fiel Remanescente. Portanto, somos confrontados com as tremendas implicações do princípio vicário”. Essa tradição, que Thornton diz estar mais profundamente expressa nos “poemas dos servos” de Isaías, moldou a mente de Jesus e a primeira geração de seus seguidores por meio do “profético da cruz”.Thornton encontra o princípio Remanescente operando na seleção dos doze feita por Jesus. Ele vê em histórias como o Sermão da Montanha que Jesus tinha uma mensagem para a multidão, mas que ele se voltou para os doze para dar mais instruções de natureza pastoral na medida em que explicavam as parábolas do reino.  O próprio Jesus, como a encarnação de Deus, foi uma expressão do princípio Remanescente e suas implicações vicárias. Além disso, Cristo é o Salvador do mundo inteiro, e é importante perceber que, exceto por alguns quilômetros quadrados no Oriente Médio, ele não se preocupou em olhar para isso. Aqui está a resposta final para o paroquialismo “estreito”: na oração e adoração de Jesus, os arredores de Belém são o mundo, seu pequeno grupo social é tanto a cura das almas quanto o microcosmo da humanidade de todas as idades, credos e classes. Em seus primeiros trinta anos de perfeita obediência, oração e adoração, toda a infância, toda a infância, toda a humanidade e toda a criação são recapituladas. Belém é o epítome de cada paróquia e de cada lar; tudo é santificado naquele cuja própria santificação é “por causa deles”. [FN: João 17:19] O ministério de Jesus não foi para os gentios, mas para “as ovelhas perdidas de Israel”, que Thornton interpreta como uma expressão do conceito Remanescente. O próprio termo “igreja”, ekklesia, referia-se nos dias de Jesus não a uma entidade universal e inclusiva, mas a uma porção do corpo geral “chamada” dela, especialmente, nas escrituras judaicas, para o propósito de adoração e oração. O ministério de Jesus foi acima de tudo um ministério de total devoção, que a Igreja é chamada a recapitular e sem o qual nada mais que Jesus fez faz sentido. Só ele orava sem cessar, só ele nunca se distraía, só ele alcançava o recolhimento perfeito. Além disso – e isso parece ter sido esquecido desde Eusébio de Cesaréia até os oratorianos franceses do século XVII – somente Jesus é o perfeito adorador do Pai. O todo no mundo da humanidade foi uma adoração que irrompeu em todos os aspectos da vida e carregou o mundo inteiro com ela. Sua adoração perpétua é tão vicária quanto sua derrota do pecado no deserto, e muita confusão seria evitada se todas as suas atividades pastorais fossem vistas neste contexto. Sua pregação, ensino, curas, absolvições e milagres não têm sentido se forem isolados da adoração. a vida de Cristo foi de adoração ininterrupta, mas porque foi gasta A igreja era o “plano pastoral” de Jesus. Seu desenvolvimento, a forma que tomou e os métodos que adotou foram desígnios divinos. “O único tema constante da história do Evangelho – como pano de fundo para o nascimento, morte e ressurreição de Jesus Cristo – é sua orientação aos Doze…” Jesus “implantou a fé, desenvolveu a oração e, no Pentecostes, enviou o Espírito Santo para guiar, dirigir e governar. ¼ Assim podemos crer que os Doze, como organismo Remanescente, têm a autoridade da direção de Cristo, e o que eles fizeram no Espírito é fruto dessa direção.”Nesta conjuntura crítica no desenvolvimento de sua teologia do Fiel Remanescente, Thornton escreve: “Se pudéssemos encontrar uma correspondência histórica entre a forma pastoral do ministério de nosso Senhor e aquela adotada por sua Igreja, então poderíamos humildemente afirmar que o conceito Remanescente como paroquial a teologia está em terreno firme”.  Thornton nega que a atividade missionária apostólica, “se implica apenas evangelismo nômade”, seja da essência da igreja. A assembléia, a ekklesia, não vagueia. “A Igreja é missionária precisamente no mesmo sentido que seu Senhor, que para salvar o mundo inteiro, vagou a pouco mais de vinte milhas de sua terra natal. "O peripatético apóstolo Paulo abraçou o conceito remanescente em sua doutrina do Corpo de Cristo. “Suas cartas não são apenas pastorais, mas essencialmente paroquiais, tratam da teologia ascética e moral, da ordem da Igreja e das relações entre a Igreja e o mundo”. O “Remanescente em transição” apostólico, “a Igreja primitiva da vida dos Apóstolos”, deixou no lugar supervisores, episkopoi, líderes em contraste com apostolo, que por definição eram viajantes. “Aqui, em embrião, está o futuro padrão da Igreja; o germe que se desenvolverá no princípio ascético da estabilidade ¼ do Corpo de Cristo no microcosmo, localizado no lugar, localizado no pão e no vinho, sacerdote e Remanescente, na Oração e no lugar: esta permanece a norma pastoral do poder missionário”.  Thornton vê o conceito de Remanescente operando em escritos do primeiro século como A Epístola de Diogneto (Capítulo 6): “… o que a alma é para o corpo, os cristãos são no mundo”. A Apologia de Tertuliano (Capítulo 39) expressa o que Thornton vê como o trabalho principal do Remanescente: “Somos um corpo formado por nosso conhecimento conjunto da religião, pela unidade da disciplina, pelo vínculo da esperança… uma congregação diante de Deus, como se em um corpo fôssemos processá-lo por meio de nossas orações”. O multitudinismo, de acordo com Thornton, nasceu com a conversão de Constantino em 313 aC e, assim, iniciou um diálogo de cerca de 1.600 anos entre “duas visões distintas… , quando a igreja foi confrontada com a complexa questão de restaurar aqueles que haviam perdido a fé para salvar suas vidas. Nesse ponto, afirma Thornton, “o Remanescente vicário começou a se assemelhar a uma seita exclusiva” e o “elemento humanista começou a ver a Igreja como uma espécie de sociedade educativa”.  A história da teologia remanescente de Thornton divaga no nascimento do “multitudinismo” em uma longa discussão sobre predestinação e eleição, assuntos historicamente controversos tornados menos controversos, afirma Thornton, por uma compreensão adequada da natureza da igreja, a saber, sua doutrina da Fiel Remanescente. De interesse aqui é sua linha de pensamento, a saber, o método pelo qual Thornton usa sua construção teológica para descer de questões teológicas abrangentes para a práxis paroquial. É da essência do trabalho de Thornton que a “teologia dogmática” seja aplicável em particular. Para Paulo, um judeu, a eleição não era “nem final nem pessoal”, mas corporativa. Thornton sugere que “paramos de pensar para o que podemos ser eleitos e consideramos para que fomos eleitos. Então a predestinação se torna, como foi para Isaías e os Doze contra Santo Agostinho e Calvino, vocacional; somos chamados à Igreja, o que implica não a salvação final, mas um trabalho. Nem a aparente ausência de tal vocação para membro da Igreja implica condenação; obviamente não pode quando vemos esse chamado, esse trabalho, como vicário, como trabalho espiritual em nome daqueles que estão – por enquanto – fora. Da mesma forma, “a conversão, como a eleição, tem muito pouco a ver com a soteriologia… [É] implica a experiência vocacional de desejar ser membro dos leigos pelo batismo…A vocação para a profissão médica e a conversão ao Corpo de Cristo são de origem comparável; mas um médico não consideraria a promoção de tal vocação em outros como seu trabalho principal. A agência direta de conversão é fruto do trabalho da profissão; na religião é adoração e obras em vez de pregação e exortação. ¼ O único método positivo de alcançar conversões é sintetizado na adoração do Remanescente que se esquece de tentar converter. Thornton encontra um Remanescente em desenvolvimento no fluxo e refluxo – reforma e declínio – da história monástica, aproximadamente do quarto ao décimo sexto século. A igreja teria morrido sem o movimento religioso dos Padres do Deserto, que criou uma espécie de dualismo eclesiástico entre a igreja estabelecida e aqueles poucos – os Remanescentes Fiéis – que rejeitavam tal mundanismo. Começando, no entanto, com Basílio, o Grande (ca. 330-379) no Oriente e Bento de Núrsia (ca. 480-ca. 550) no Ocidente, o dualismo foi reduzido enquanto as tradições monásticas mantiveram a doutrina remanescente essencial de regra. Em particular, Thornton encontra na reforma cisterciense do século XII evidências reveladoras da dinâmica Remanescente; isto é, os conversi, camponeses recrutados em mosteiros para trabalho agrícola. Assim, temos os monges do coro original, cujo trabalho era opus Dei, a obra de Deus em oração e louvor, com o trabalho agrícola como parte essencial dela; e depois os conversos, cuja vocação era reconhecidamente a agricultura, mas tendo a Oração como corolário natural. Este foi o monaquismo no contato mais próximo com a população secular circundante ¼ Aqui temos uma admissão clara de vocação pronunciada em alguns e pouca vocação em outros, mas a ideia penetrante de progresso de qualquer ponto para a Visão de Deus torna qualquer padrão rígido sem sentido. Por um lado, o único padrão cristão é a perfeição; por outro, existem padrões progressivos de multiplicidade infinita. Mas o tempo todo existe uma distinção pastoral entre o Remanescente vinculado pela Regra e as multidões. Thornton conclui que o Remanescente como expressão da prática paroquial leiga teria sucedido o monasticismo medieval na Inglaterra se os mosteiros não tivessem sido dissolvidos por Henrique VIII no século XVI. “Por este acidente da história, a Igreja da Inglaterra ficou com o cadáver de um antigo Remanescente e o embrião ainda não nascido de outro. Os monastérios foram destruídos cem anos antes que o padrão Remanescente alternativo estivesse completo.” A igreja inglesa – o anglicanismo – emergiu da reforma protestante com o Livro de Oração Comum que “aponta claramente para a regra leiga…E de tudo isso desenvolveu-se uma linha de ascetismo puro e especificamente inglês: através de Lancelot Andrewes, William Law, Jeremy Taylor, George Herbert, daí até a reforma de Oxford, podemos traçar uma linha direta de volta a Julian de Norwich, Richard Rolle, Walter Hilton e São Gilberto de Sempringham. Por duzentos anos, no entanto, de Herbert a Keble, o Remanescente permaneceu adormecido até ser ressuscitado pelo espírito da reforma de Oxford, onde Martin Thornton afirma ter retomado o fio da meada na Inglaterra do século 20 do pós-guerra assolada por dificuldades econômicas, declínio membros da igreja e uma escassez de clérigos. No fundo, a teoria do Remanescente de Thornton é uma apologia a um modelo específico de prática ascética cristã compatível com a eclesiologia anglicana da alta igreja. Thornton se considerava um “rebelde brando” com “visões não convencionais”, mas era aliado de alguns dos elementos mais conservadores da alta igreja da Igreja da Inglaterra, cuja menor evidência pode ser vista em seu admiração pelo neotomista EL Mascall. Thornton representou não apenas uma visão minoritária dentro da Igreja da Inglaterra, mas também uma minoria dentro da minoria. Os anglo-católicos de meados do século 20 ficaram notoriamente divididos sobre a reforma do Livro de Oração Comum. A maioria de mentalidade mais litúrgica acreditava que a reforma do livro de orações não tinha ido longe o suficiente para restaurar a prática católica e, portanto, compilou um livro de orações “aprimorado”, The Anglican Missal, publicado pela primeira vez em 1921. Thornton tinha grande consideração pelo livro de oração, embora não seu lecionário de 1928. Seu trabalho publicado provocou cobertura pela imprensa da igreja e críticas em jornais teológicos. Talvez por sua própria natureza, no entanto, a teoria do Remanescente não desencadeou um movimento.

EM MISSÃO

Pe. Wesley Walker/APA/ EUA

Em contextos cristãos, a palavra “missão” muitas vezes nos faz pensar em ir a outras partes do mundo em viagens missionárias de curta duração ou trabalho missionário em aldeias remotas. Essas imagens mentais não estão erradas, mas são incompletas. Quando usamos o termo “missão” em relação à Igreja, estamos falando sobre a vocação dela: a identidade da Igreja, o propósito da Igreja e quais atividades estão sob esse guarda-chuva. Esta semana, +Bp. Stephen Scarlett, o reitor da Paróquia de São Mateus, na Califórnia e o Bispo da Diocese da Santíssima Trindade da Igreja Católica Anglicana, organizou uma conferência e um retiro sobre o tema da missão em parceria com nossa própria Diocese dos Estados Unidos do Leste da Província Anglicana da América na Montserrat Jesuit Retreat House em Dallas, Texas. Muito foi dito na conferência por muitos ministros exemplares em nossa comunhão G3 de igrejas que estão na vanguarda da vivência do Evangelho no século XXI. Espero compartilhar mais dessa sabedoria no futuro, à medida que minhas reflexões forem fomentadas. A principal coisa que me chamou a atenção foi que existem realmente duas maneiras de abordar a missão da Igreja: uma abordagem consumista e uma abordagem orgânica. A abordagem consumista reduz a missão de uma freguesia ao franchising. Essa visão de missão lança a identidade da paróquia puramente nas coisas externas – estética, programas, etc. Essas coisas importam, é claro, mas são meios para o fim, não o fim em si. O objetivo do alcance do ponto de vista do consumidor é simplesmente marketing para perpetuar a marca. Isso representa um problema. Nas palavras do filósofo Marshall McLuhan, “O meio é a mensagem”. Se comercializamos a paróquia principalmente por meio de publicidade, se oferecemos programas e liturgias como meio de satisfazer desejos consumistas, então a paróquia é um produto. Em última análise, esta é uma visão da Igreja inerentemente compartimentalizada; vê a Igreja como um produto entre outros produtos, o que também significa que pode ser descartada quando deixa de “fazer” por nós. +Bp. Há um caminho melhor. A alternativa ao marketing é uma abordagem orgânica e missionária. Isso começa com a ideia da Igreja como o Corpo sacramental de Cristo que centra sua vida em torno da koinonia, ensino apostólico, a Eucaristia e a oração corporativa (Atos 2:42-47). O resultado dessa abordagem é ver cada membro da Igreja como um missionário e a principal vocação da Igreja de pastorear os membros no caminho da santidade e converter os pecadores com o Evangelho. O objetivo nunca é a atração via truque, mas um convite relacional para a vida da Igreja. Essa abordagem é árdua porque requer autenticidade e verdadeiro discipulado. Se é assim que pensamos sobre a missão, não podemos ser espectadores secundários, mas participantes ativos que reconhecem o discipulado como sua principal vocação. Para que a Igreja seja saudável, seus membros devem assumir a postura de missionários. Isso começa com um amor por Jesus Cristo. O que quer que venha depois disso, deve ser moldado e catalisado por um relacionamento ativo com Nosso Senhor. Esse amor, porém, deve ser expresso no discipulado, uma busca disciplinada de Deus que se organiza em torno do amor de Deus. Isso nos permite ir “mais e mais longe” em nosso relacionamento com Jesus por meio da vida espiritualmente formada que é centrada na Santa Ceia, no Ofício Diário e em uma vida de oração privada e estruturada. Esta vida que se baseia na comunhão com Deus e com a sua Igreja vai transbordar e exprimir-se no desejo de partilhar a fé com os outros. Isso acontece não por meio de apresentações bacanas, apresentações carismáticas, e gregária, mas através de uma verdadeira abertura aos outros e de uma autêntica hospitalidade que vê os outros não como consumidores a serem entretidos, ou mesmo potenciais novos paroquianos, mas como seres humanos necessitados do Evangelho. Se tivermos amor a Deus, formação espiritual e zelo evangelístico, então podemos viver como missionários em uma cultura que precisa desesperadamente do Evangelho. Esta conferência sobre a missão foi um encorajamento. Devo dizer que estavam presentes membros de toda a nossa Comunhão G3: a Província Anglicana da América, a Igreja Católica Anglicana (incluindo a Diocese de Santa Cruz) e a Igreja Anglicana na América. Como diz o salmista (133.1), “Quão bom e quão suave é que os irmãos vivam juntos em união!” Ainda mais, a conferência ofereceu um esclarecimento maravilhoso de bispos e padres que tiveram sucesso em viver essa abordagem orgânica da missão. No século 21, a Igreja como um todo está em uma encruzilhada; deve escolher neste dia a quem servirá. Podemos escolher a abordagem de marketing — uma abordagem que foi um fracasso em meados do século 20 — e continuar a reduzir a identidade da Igreja a um exercício consumista de branding. Por outro lado, podemos adotar uma abordagem missional orgânica que começa com a adoração de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo e convida outras pessoas a esse modo de ser. Se escolhermos o último, escolhemos o “caminho estreito” (Mt 7, 13-14), mas este é o caminho certo. A missão é sempre e, em última instância, sobre fidelidade.

 Por Rev. Dr. Rodson Ricardo 

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