O INCLUSIVISMO DE C. S. LEWIS


Por Prof. Pedro Mendes

“Se você é cristão, não precisa acreditar que todas as outras religiões estão simplesmente erradas de cabo a rabo”, escreveu, C.S.Lewis. E ainda acrescentou: “Se você é cristão, está livre para pensar que todas as religiões, mesmo as mais esquisitas possuem, pelo menos, um fundo de verdade. ” (Cristianismo puro e simples, p.47). Estas palavras fundamentam a soteriologia inclusivista de C.S. Lewis, cujas raízes remontam a uma antiga tradição patrística, persistindo no pensamento de muitos teólogos da atualidade.  

O inclusivísmo é a doutrina cristã que ensina que é possível ser justificado através de Jesus Cristo sem conhecimento explícito ou completo de quem ele é. Isso não anula a singularidade do cristianismo. Embora, uma pessoa possa ser salva sem praticar explicitamente o cristianismo, ela não poder ser salva sem Cristo. A verdade está espalhada por toda parte. Há lampejos dela nas antigas tradições e até nos mitos e filosofias pagãs, encontrando sua realização final na fé cristã.

Há uma tradição significativa do inclusivísmo defendida por muitos pais da igreja, particularmente, Justino Mártir ( 100 – 165 d.C). Para ele, a manifestação de Deus se dá mediante o Verbo (Logos), que não está limitada a economia cristã. Ela se deu, antes da encarnação do Verbo entre os judeus e os gregos: onde quer que tenha havido pessoas que viveram segundo o Verbo, merecem o nome de cristãos. C.S.Lewis, mesmo sendo um teólogo leigo, levou essas ideias mais adiante. E isso pode ser percebido em sua vasta quantidade de escritos. 

a. Nos mitos: Muitos mitos antigos, tanto aqueles que falavam de um sacrifício vicário como aqueles que falavam de um deus que morre e volta à vida, eram presságios de um sacrifico maior, de um Deus que historicamente se tornaria homem, morrendo vicariamente pela humanidade. Assim, Lewis escreveu: “Se encontrei a ideia de um deus sacrificando-se, gostei muito dela e fui misteriosamente movido por ela; outra vez, se encontrei a ideia de um deus morrendo e revivendo ( Balder, Adônis, Baco), de forma semelhante, ela me moveu, pois não a encontrei em parte alguma senão nos Evangelhos.”(Carta a Arthur Greeves, p.345)Cristo, desse modo, foi a materialização do mito e sua realização final.

b. Na teologia: Para C.S.Lewis, a exemplo dos crentes do Antigo Testamento – não é necessário que o indivíduo tenha conhecimento efetivo de Jesus para se beneficiar de sua salvaçãoO fato decisivo não é se uma pessoa conhece Jesus, mas se Jesus conhece tal pessoa “Existem membros de outras religiões que, pela influência secreta de Deus, são levados a concentrar-se naqueles elementos de suas religiões que concordam com o cristianismo, e que assim pertencem a Cristo sem saber”, comenta Lewis(Cristianismo puro e simples, p.276). Dessa forma, uma pessoa, mesmo sem ter conhecimento explícito de Cristo, pode se concentrar naqueles elementos que concordam com o cristianismo, e pode estar seguido a Cristo sem saber. Lewis cita, como exemplo, o caso de um budista sincero, que apesar de nunca que ter conhecido nada sobre Cristo, mas que de boa vontade pode “ser levado a concentrar-se cada vez mais na doutrina budista da compaixão, deixando em segundo plano os elementos doutrinais.” (p.276). Nesse caso, não somente os santos do Antigo Testamento, mas também muitos pagãos que viveram antes do nascimento de Cristo foram alcançadopela ação secreta de Deus.

C. Na ficção: o inclusivismo de C.S.Lewis também está presente em suas obras de ficção, principalmente na sua aclamada obra “As Crônicas de rnia. Acontece um fato curioso e interessante na crônica “A última batalha. "Quando o soldado Emeth encontra-se com Aslam, se joga num mundo de medo e culpa pelo fato de ter adorado e cultuado ao deus Tash durante toda sua vida. Mas Aslam, o consola dizendo:...Todo serviço que tens prestado a Tash (o demônio, deus falso), eu considero como serviço a mim (Aslan). Não porque ele e eu: sejamos um, mas por sermos oposto um ao outro é que tomo para mim os serviços que tens prestado a ele.” (A última batalha, p. 727)Não há outra fonte máxima do favor divino além de Aslam. Entretanto, O amor de Aslam por todas as criaturas narnianas e carlomanas, geralmente o faz operar por quaisquer meios necessários para tentar trazer para sim essas criaturas. Aqueles que buscam sinceramente a verdade, acabam encontrando a verdade, mesmo que num estado de ignorância estejam buscando errado.


C. S.Lewis não acreditava que todas religiões eram igualmente verdadeiras ou mesmo falsas. Ele não era um pluralista. Ele também não acreditava que toda verdade estivesse centrada e completa no cristianismo. Ele não era um exclusivista.  Como cristão convicto, ele acreditava na veracidade e supremacia da fé cristã, mas que muitas de suas verdades foram, de certa maneira, antecipadas e reveladas, em outras culturas, mas que encontrariam sua expressão máxima no cristianismo. Por isso, ele era inclusivista

 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

C. S.Lewis: Do ateísmo a fé de seus pais